A tese foi levantada pelo historiador Adriano Marinazzo, um dos maiores especialistas na obra de Michelangelo, o grande mestre do Renascimento italiano. Marinazzo levantou a hipótese a partir da leitura de um soneto que o artista enviou para seu amigo Giovanni da Pistoia, no qual descreve as dificuldades que o trabalho impunha à sua saúde, especialmente a posição em que era obrigado a ficar para pintar no teto. Entre outros pontos, o texto se refere às gotas de tinta que pingavam sobre seu rosto. Ao contrário da lenda, segundo Marinazzo, Michelangelo não ficou deitado, mas sim numa posição que lembra a imagem central de sua obra prima no teto, “A Criação de Adão“, quando Deus quase toca Adão, que representa a humanidade.

Na mensagem para Giovanni da Pistoia, Michelangelo desenhou, na margem da carta, um homem que se presume seja ele, com o braço esticado, na posição semelhante à da pintura. Para Marinazzo, essa semelhança entre o desenho na carta e a imagem no teto da capela é um indício muito forte de que Michelangelo aproveitou para fazer seu autoretrato. Além do texto e do desenho no papel, para sustentar sua tese, Marinazzo lembra que Michelangelo era conhecido por seu senso de humor. “Ele via a si próprio como o Messias da arte, portanto, isso faz sentido“, afirma Marinazzo.

E o historiador vai mais longe, afirmando: “Ele escondeu a si próprio naquela imagem do teto. O rosto é idealizado porque Michelangelo tinha noção de que seu nariz era amassado, mas ainda assim foi o mais perto que chegou de um autoretrato“.

O soneto escrito pelo artista faz parte dos arquivos da Biblioteca Michelangelo, de Florença, que guarda inúmeros documentos relacionados com o mestre renascentista.

Michelangelo pintou cerca de 300 personagens bíblicos, no teto da Capela Sistina, mas a imagem central é “A Criação de Adão”. Acredita-se que, em parte do trabalho, ele fazia os desenhos e seus auxiliares completavam a tarefa, supervisionados por ele.

A imagem de Deus é semelhante à desenhada por Michelangelo em carta para o amigo, segundo o historiador Adriano Marinazzo. (Foto: Wikimedia Commons)

Adriano Marinazzo, que publicou essa tese na prestigiada revista italiana Critica d’Arte, é curador de projetos especiais do Muscarelle Museum of Art , um museu universitário afiliado ao College of William & Mary em Williamsburg, Virgínia, EUA.

William Wallace, historiador da Washington University, que escreveu oito livros sobre Michelangelo, acredita que a tese de Marinazzo é interessante e pode ser verdadeira. Wallace também se refere ao senso de humor de Michelangelo: “Ele gostava de rir de si mesmo e isso pode ser um indicativo“.

Gary Radke, especialista em renascimento italiano da Universidade de Syracusa, Nova York, acredita que Marinazzo levantou uma questão interessante. Radke lembra que o artista valorizava muito seu trabalho e pode ter, inconscientemente, se retratado na figura de Deus.