Três famílias canadenses brigam na justiça contra empresa porque game teria gerado surtos e problemas emocionais em filhos
Enquanto jogava “Fortnite” por volta de janeiro de 2019, um menino entrou em surto catatônico, teve febre, dificuldade para respirar e formular pensamentos, de acordo com um processo que corre na Justiça do Canadá.
Seu pai afirma que o menino, agora com 17 anos, estava experimentando seu primeiro ataque de pânico, a partir da pressão provocada pelo popular videogame. Após o menino sofrer outro ataque de pânico, oito meses depois, o pai conta que ele foi diagnosticado com “ciberdependência” e passou a ser atendido por psicólogos e psiquiatras em um centro de reabilitação de dependentes químicos.
Essas alegações fazem parte de um processo movido por três pais canadenses contra a Epic Games, desenvolvedora de “Fortnite”. Os pais argumentam que o jogo é viciante, causa adição e mudou para pior a vida de seus filhos.
A ação, deflagrada em outubro de 2019, teve investigação autorizada por um juiz da cidade de Quebec na semana passada.
Em uma declaração ao The Washington Post, a porta-voz da Epic Games, Natalie Munoz, escreveu: “Vamos lutar contra isso no tribunal. Acreditamos que as evidências mostrarão que este caso não tem mérito.”
Os pais que entraram com o processo dizem que seus filhos, em alguns casos, pararam de comer, tomar banho ou manter relações sociais por causa de sua obsessão pelo jogo. Eles também argumentam que as crianças não são maduras o suficiente para entender os termos de serviço do jogo.
“O Fortnite criou, por meio de seu marketing, um ciclo vicioso no qual as crianças devem comprar itens para se sentirem realizadas e aceitas por seus colegas”, afirma o processo, “aproveitando-se de sua posição vulnerável”.
Após as audiências de julho, o juiz da Corte Superior de Québec, Sylvain Lussier, escreveu em uma decisão de 7 de dezembro que o caso não é “frívolo” ou “manifestamente infundado”. Como analogia, Lussier escreveu: “O efeito prejudicial do tabaco não foi reconhecido ou admitido da noite para o dia.”
Se o processo triunfar, escreveu Lussier, os jogadores viciados residentes em Québec poderão ser indenizados.
O advogado Jean-Philippe Caron, que representa os queixosos, disse que, na semana passada, mais de 200 pais na província canadense lhe enviaram um e-mail dizendo que o bem-estar de seus filhos também havia sido prejudicado pelo “Fortnite”.
“Nos sentimos extremamente confiantes sobre este caso”, disse Caron.
Munoz, porta-voz da Epic Games, disse que “Fortnite” permite que os pais supervisionem o tempo de jogo de seus filhos e que estes solicitem sua permissão antes das compras. “Usuários com menos de 13 anos têm um limite diário de gastos de US$ 100.”
As crianças mencionadas nas ações teriam jogado o Fortnite por milhares de horas. Uma delas teria completado 7.781 partidas em dois anos. Os pais que abriram o processo alegam que seus filhos agora usam linguagem vulgar e não encontram alegria em outras atividades.
O garoto que sofreu ataques de pânico baixou o jogo pela primeira vez aos 15 anos, em março de 2018. Seu responsável afirma que ele participou de 6.923 partidas, o que equivale a 59.954 minutos ou o equivalente a quase 42 dias inteiros de jogo. O menino muitas vezes se nega a parar de jogar e isso gera grandes discussões familiares, contam os pais. Segundo eles, o menino já teria gasto mais de US$ 5.550 em compras de itens do jogo.
A mãe “não tinha ideia das consequências danosas que Fortnite teria para seu filho”, diz o processo, “e se ela tivesse sido informada pelos réus dos riscos e perigos associados ao uso do produto, ela teria recusado categoricamente para permitir que o jogo fosse baixado pelo filho”, conclui o texto da ação.