Plataforma altera a maneira como as pessoas pensam, escrevem e pode estimular a "cola"
Um programa de Inteligência Artificial capaz de produzir textos completos se transformou em mais uma preocupação para os professores. Como eles vão saber se o aluno estudou realmente o assunto e se preparou para uma prova escrita? Inicialmente, usada para edição, a Inteligência Artificial conseguia corrigir erros gramaticais, de conjugação e até sugestões de novas palavras. Com o tempo, a tecnologia se desenvolveu a ponto do surgimento de programas em que uma única palavra pode se transformar em um texto totalmente novo, produzido pela IA. Este é um exemplo da plataforma ChatGPT lançado pela empresa OpenAI.
Se antes já era um desafio verificar se os alunos estavam tirando trechos inteiros de textos já escritos na internet, imaginem agora que os textos são produzidos pelo computador. A linguista e professora da “American University”, Naomi Baron, afirma que o problema vai muito além da “cola” entre os alunos. A utilização destas plataformas ameaça impedir o desenvolvimento das habilidades de escrita de toda uma geração.
A escrita faz parte da humanidade há muito tempo. Em 3.500 a.C, sumérios desenvolveram a escrita cuneiforme na Mesopotâmia, sendo considerado um dos primeiros sistemas de escrita. Além de ser um registro, sendo utilizada em documentos, a escrita está presente nos livros de ficção ou de História e também é reconhecida como uma forma de ajudar as pessoas a pensar. Escritores como a autora norte-americana, Flannery O’Connor, afirmavam “escrevo porque não sei o que penso até ler o que digo”.
Em uma pesquisa para a produção de seu novo livro, Naomi Baron, conversou com jovens sobre os efeitos da inteligência artificial na escrita humana. Os entrevistados afirmaram que apreciam a ajuda da IA na correção da ortografia e na conclusão dos textos, como aqueles usados em celulares.
Um dos jovens disse a Naomi que acredita que está tudo bem usar estes mecanismos de completar palavras, principalmente quando está com preguiça. Outro afirmou que o uso de plataformas que corrigem ortografia, pode ocasionar a perda de conhecimento de regras da língua. “O software de verificação ortográfica e a Inteligência Artificial podem ser usados por pessoas que desejam uma saída mais fácil”, conta outro jovem durante sua pesquisa.
A chave do problema pode estar possivelmente aí. Ao procurar saídas mais fáceis e rápidas, os jovens deixam de desenvolver a escrita, afetando não apenas seu conhecimento sobre ela, como a forma de escrever. Um aluno de ensino médio por exemplo, afirmou que ao usar plataformas de correção de escrita, ele não reconhece o próprio texto. Ele sofre tantas adaptações de correção, que os textos perdem o estilo, a “forma” de quem está escrevendo. Isso se agrava no caso das plataformas que fazem o texto totalmente novo, com assunto ou palavras sugeridas pela pessoa. Os textos se tornam padronizados e consequentemente, parecidos.
Naomi em um artigo publicado sobre sua pesquisa, conta ainda que estas plataformas impedem que o autor chegue em uma das etapas mais importantes da escrita, que é a revisão. Ao fazer a própria revisão de seu texto, o aluno ou um escritor precisa de um primeiro rascunho ou de vários para chegar a um texto original. Os erros, incluindo os ortográficos são cometidos até pelos melhores escritores e fazem parte do processo da escrita.
Com o intuito de ver a resposta do robô da “ChatGPT”, Naomi pergunta à plataforma se ela representa uma ameaça à motivação dos humanos para escrever. A inteligência artificial respondeu: “Sempre haverá uma demanda por conteúdo criativo e original que exija a perspectiva única e a visão de uma pessoa”. Naomi afirma que se sentiu aliviada com a resposta. Ela só espera que assim como a IA, os humanos percebam não tarde demais, que a escrita humana não pode ser totalmente substituída totalmente pela automatização dos computadores.