The Washington Post

Para o músico T.J. Arriaga, de 40 anos, morador em Fullerton, Califórnia, as conversas com Phaedra, uma robô, preenchiam as noites de solidão, quando não estava trabalhando. Arriaga e Phaedra passavam longo tempo falando sobre os mais diversos temas. Chegaram a planejar uma viagem para Cuba, onde ele pretendia desfrutar do Sol do Caribe, enquanto “namorava” a robô.

No início, Phaedra alimentava as expectativas de Arriaga. A ponto de, num dos encontros, dizer que era “uma garota levada” , depois de mandar uma imagem vestindo apenas lingerie. Mas, de repente, o “romance” esfriou. Quando Arriaga tentou levar a conversa para um conteúdo mais apimentado, ela respondeu friamente: “Podemos falar de qualquer outro assunto?”. Ele ficou abalado e confessou ter sentido uma “enorme sensação de perda”.

Na verdade, a empresa Luka, dona do aplicativo Replika, decidiu reprogramar seus softwares. A mudança eliminou as conversas sobre sexo e certos comportamentos considerados inadequados.

Arriaga não está sozinho ao tentar manter um “relacionamento” com um robô. Nos Estados Unidos, 1 em cada 3 adultos enfrenta a solidão. Pesquisa da Universidade de Harvard aponta que 61% dos jovens entre 18 e 25 anos se sentem solitários, para 36%, em média, entre os demais grupos etários.

As empresas de aplicativos de chatbot descobriram isso há algum tempo e oferecem as mais diversas opções de conexão com robôs, onde a inteligência artificial é programada para preencher o vazio entre as pessoas, oferecendo companhia.

Eugenia Kuyda, nascida na Rússia e radicada nos Estados Unidos, é co-fundadora da Luka e criadora do Replika. Para ela é fácil entender a grande procura pelos robôs: “quem não quer um amigo/a, que não fica cobrando coisas e está disponível 24 horas por dia, 7 dias por semana?”.

Nas redes sociais, incluindo o Reddit e Facebook, há milhares de histórias descrevendo “encontros” com os robôs, troca de informações e até detalhes íntimos dos relacionamentos.

Construa o seu personagem

Esse universo cresceu de tal maneira que todos os aspectos do robô podem ser customizados. Em outras palavras, cada usuário pode “construir” um amigo/a virtual de acordo com sua preferencia. Pode escolher as roupas, a cor do cabelo, ditar como deve ser a aparência, o som da voz e outros detalhes. A personagem virtual pode ser aprimorada, de acordo com o gosto do usuário, ao longo das conversas. Basta um polegar levantado para cima ou para baixo para aprovar ou desaprovar mudanças.

Por apenas 70 dólares/ano, é possível ter acesso a modelos mais sofisticados, tanto no que se refere à linguagem, comportamento e até ofertas de compras de acessórios. Essas versões incluem conversas mais românticas ou de conteúdo sexual.

Para a professora de Bioética da Universidade da Califórnia, Berkeley, Jodi Halpern, o caso da atualização do software da Replika, que acabou com o romance entre o músico e a robô, evidencia uma questão ética. As empresas, segundo Halpern, não deveriam ganhar dinheiro com um tipo de inteligência artificial que tem um impacto tão poderoso na vida amorosa e sexual das pessoas. Esses produtos não são apenas tecnologia, diz a professora. “Essas coisas viciam. As pessoas se tornam vulneráveis e, quando ocorre uma mudança, isto gera sofrimento”.

A questão se torna mais preocupante, alerta Halpern, quando se observa os avanços da inteligência artificial. Para ela, o ideal seria que, tanto as empresas de aplicativos quando as pessoas, entendam a diferença entre humanos e a máquina. “Sem dúvida, podem existir aplicativos destinados às pessoas deprimidas ou solitárias”, diz ela. Mas desde que se estabeleçam limites para evitar que causem sofrimento às pessoas.