Alteração transgênica aumentou em 33% o rendimento da lavoura sem perda de qualidade
Uma equipe de pesquisadores, liderada por especialistas da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, conseguiu alterar o processo de fotossíntese em plantas de soja, utilizando recursos da Engenharia Genética.
Os cientistas aumentaram a eficiência da absorção de luz solar pelas plantas, o que resultou em maiores rendimentos na lavoura, sem perda de qualidade. É a primeira vez que a bioengenharia multigênica da fotossíntese melhora o rendimento de uma cultura alimentar em testes de campo.
Combate à fome
Aumentar o rendimento de culturas agrícolas de forma sustentável para fazer frente ao crescimento da demanda por alimentos é uma questão que está na ordem do dia.
De acordo com o relatório da ONU, intitulado O Estado da Segurança Alimentar e Nutricional no Mundo 2022, quase 10% da população mundial não tem o que comer e até 2030, mais de 660 milhões de pessoas deverão enfrentar escassez de alimentos e desnutrição, segundo dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
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A pesquisa trabalhou com duas perspectivas. Melhorar a cadeia de abastecimento em áreas pobres, para que mais pessoas tenham acesso a alimentos, e aperfeiçoar as condições de cultivo diante do quadro de mudanças climáticas que atingem as lavouras.
Os pesquisadores fazem parte de uma rede de cooperação internacional chamada RIPE – Realizando Aumento da Eficiência Fotossintética, que visa aumentar a produção global de alimentos, melhorando a eficiência fotossintética em culturas alimentares para pequenos agricultores na África Subsaariana.
A rede conta com apoio financeiro da Fundação Bill & Melinda Gates, Fundação para Alimentação e Agricultura Research e UK Foreign, Commonwealth & Development Office.
Os líderes da pesquisa defendem uma mudança no nível de oferta de alimentos para mudar a trajetória de fome e desnutrição nos países em desenvolvimento.
“Nossa pesquisa mostra uma maneira eficaz de contribuir para a segurança alimentar para as pessoas que mais precisam, evitando que mais terras sejam colocadas em produção. Melhorar a fotossíntese é uma grande oportunidade para obter o salto necessário no potencial de rendimento”, declara Amanda Pereira de Souza, botânica brasileira que integra o projeto RIPE e principal autora do estudo.
A fotossíntese é um processo físico-químico realizado naturalmente por todas as plantas, através da conversão da luz solar em energia e rendimento.
De forma natural, este processo de fotossíntese tem mais de 100 etapas para ser concluído, o que o torna lento e até certo ponto “ineficiente”, segundo os cientistas.
O que os pesquisadores do RIPE fizeram em mais de uma década de estudos foi acelerar este processo dentro da planta de soja, eliminando os intervalos em que as folhas ficam ociosas quando há variação de luz.
Quando a planta está exposta ao sol ativa-se uma fotoproteção nas folhas para protegê-las de danos. Assim, elas conseguem liberar o excesso de energia.
Mas, quando as folhas estão na sombra essa fotoproteção precisa ser desligada para que elas continuem o processo de fotossíntese com uma reserva de luz solar.
Esse processo demora vários minutos até a planta desligar o mecanismo de proteção, ou seja, perde-se um tempo valioso que poderia ser usado para o desenvolvimento mais rápido da leguminosa.
Dessa forma, as folhas ganham um tempo extra de fotossíntese. Ao final, ao longo de toda a estação de crescimento, a aceleração gera um aumento da taxa fotossintética total.
Os testes de campo demonstraram um incremento de 33% na produtividade da soja transgênica em comparação com a soja comum. Entretanto, a adoção da nova tecnologia não diminuiu o teor de proteína dos grãos nem alterou as suas características nutritivas.
O estudo completo foi publicado na revista Science.
Há outro possível ganho adicional da soja transgênica. Os pesquisadores acreditam que a soja modificada poderia retirar cerca de 10% a mais de carbono da atmosfera somente com a otimização da fotossíntese. Isso seria uma eficiente estratégia para mitigação das mudanças climáticas. Mas essa hipótese ainda depende de comprovação em experimentos de campo.
A equipe de Illinois realiza estudos semelhantes para aumentar a produtividade da mandioca.
Apesar do caráter humanitário da pesquisa, comitês de ética de renomadas universidades advertem para a adoção de cuidados extras. A introdução de cultivos transgênicos requer a realização de estudos sobre possíveis impactos ambientais e à saúde dos consumidores.