No velório da filha de conselheiro de Putin, russos continuaram a acusar ucranianos por atentado a bomba em Moscou
Seis meses após a invasão da Ucrânia pela Rússia, a guerra segue provocando consequências devastadoras para a população ucraniana e até para povos distantes do conflito, que sofrem com a falta de alimentos ou a alta nos preços. Na Ucrânia, dados do governo indicam que mais de 9 mil soldados morreram, enquanto o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos calcula em mais de 5 mil civis mortos e 6 mil feridos.
Por sua vez, a Rússia não divulga o número de vítimas, mas dados da CIA e do MI6, o serviço de inteligência britânico, indicam que pelo menos 15 mil soldados russos já morreram no conflito. A ameaça de uma catástrofe nuclear está relacionada com os combates no entorno da usina de Zaporizhinia, área ocupada pelas tropas russas, mas sob frequentes combates. Os dois lados trocam acusações sobre a responsabilidade de um eventual bombardeio que possa atingir os reatores da usina, provocando um vazamento radioativo que poderia contaminar a Europa, Ásia e outras regiões.
Ocorreu hoje, em Moscou, o velório de Darya Dugina, filha daquele que é considerado o maior conselheiro do presidente russo, Vladimir Putin, Alexander Dugin. Assim como o pai, um intelectual ultranacionalista, Dugina era defensora da invasão russa à Ucrânia. A Rússia atribui à Ucrânia o ataque a Dugina, que morreu em atentado após explosivos colocados embaixo de seu veículo serem detonados. Kiev nega as acusações e culpa Moscou.
Segundo a agência de notícias France Presse, centenas de pessoas acompanharam a cerimônia. Dugin e sua esposa sentaram ao lado do caixão da filha. Ele se tornou conhecido nos anos 1990, durante o caos intelectual que surgiu após a dissolução da União Soviética e afirma ter influência nas decisões de Putin. O presidente russo nunca o apoiou publicamente, mas ontem o Kremlin divulgou uma mensagem de pêsames pelo ocorrido.
No lado econômico, a guerra provocou uma violenta alta nos preços do petróleo e gás, fato que levou a uma disparada da inflação em dezenas de países. Ao mesmo tempo, as exportações de cereais da Ucrânia, um dos maiores produtores de grãos do mundo, foram interrompidas durante meses e, só há duas semanas, foram retomadas, mas ainda lentamente.
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Nesta quarta-feira, dia 24, completam-se seis meses desde que as tropas russas cruzaram a fronteira e avançaram sobre o território ucraniano. A data coincide com as comemorações do 31º aniversário de independência da Ucrânia do domínio soviético. As autoridades proibiram manifestações na capital, Kiev, temendo a ação de grupos extremistas que poderiam se aproveitar da aglomeração para promover atentados.
Na cidade de Kharkiv, no norte do país, a medida foi mais severa. Haverá toque de recolher a partir de terça-feira a noite. Outras cidades podem adotar a mesma restrição. A população de todo o país está sendo orientada a evitar locais públicos nos próximos dias.
Essas medidas foram anunciadas depois que o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, alertou para o risco de que a Rússia faça “algo particularmente feio” durante as comemorações da independência. Coincidência ou não, o dia da independência ucraniana cai no mesmo dia em que se completarão seis meses da guerra entre Ucrânia e Rússia.
Ao invadir o território da Ucrânia, o governo russo utilizou os mesmos argumentos que usou para tentar justificar a tomada da Crimeia, em 2014. Para Moscou, a Ucrânia é parte do que os ideólogos do Kremlin costumam chamar de A Grande Rússia.
Para complicar esse quadro, a Rússia é o terceiro maior produtor de petróleo do mundo e um dos principais exportadores de gás natural, fertilizantes e trigo. A produção de alimentos da Ucrânia alimenta igualmente milhões de pessoas em todo o mundo.
A dependência da Europa em relação ao petróleo e gás natural russos ou mesmo de fertilizantes e grãos produzidos tanto pela Ucrânia quanto pela Rússia impactam fortemente a economia global. Na Alemanha, muitas indústrias de base que dependem do gás natural russo para manter suas plataformas em operação, estão em compasso de alerta.
Além do gás custar quinze vezes mais caro do que antes da guerra, as indústrias alemãs temem um desabastecimento, já que as concessionárias podem não ter condições de armazenar um volume suficiente de gás natural para o inverno ou pelo risco de a Rússia cortar o fornecimento do produto em resposta às muitas sanções impostas pela Europa contra a invasão na Ucrânia.
Diante deste cenário, especialistas consideram a possibilidade de um racionamento de gás na Alemanha, o que poderia reduzir e até paralisar a atividade de indústrias siderúrgicas, farmacêuticas e lavanderias comerciais.
Com a inflação em alta e os custos de energia cada vez mais elevados crescem os rumores de um inverno frio e escuro na Europa à beira de uma recessão.
Os efeitos econômicos da guerra extrapolam os limites territoriais da Europa.
A guerra da Rússia levou o Fundo Monetário Internacional (FMI) a rebaixar de 4,9% para 3,2% as expectativas de crescimento da economia global. Essa previsão está muito abaixo dos 6,1% registrados em 2021.
Alimentos mais caros e escassos por causa do corte dos embarques de fertilizantes e grãos da Ucrânia e da Rússia, podem produzir fome e agitação generalizada nos países em desenvolvimento. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), o aumento dos preços de alimentos e da energia arrastou 71 milhões de pessoas para a pobreza em todo o mundo.
Os mais afetados pelos efeitos da guerra foram os países dos Balcãs e da África subsaariana. Uma projeção feita pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) indica que 181 milhões de pessoas em 41 países podem sofrer uma crise de fome ainda em 2022.
Se de um lado a guerra alimenta a inflação, bancos centrais de vários países aumentam as taxas de juros na tentativa de segurar a alta de preços. Mas o resultado com a intervenção tende a brecar também o crescimento das economias, já que o juro alto freia o consumo, os investimentos em produção e pode gerar recessão e desemprego.