Roteiristas de Hollywood e escritores têm enredos prontos para filmes e livros nas mortes misteriosas de figuras proeminentes na Rússia
Certas pessoas na Rússia devem ficar longe de janelas abertas, de hotéis ou apartamentos e de escadarias altas, além de tomar cuidado com o que bebem. Mais do que a maioria, vale para essas pessoas o antigo conselho: cuidado com quem andas.
Na Rússia de Vladimir Putin, qualquer crítica ao governo ou a ideia de ficar do “lado errado” na política pode ser fatal. Nos tempos atuais – nunca se sabe – até pensar em críticas pode ser perigoso.
A lista de mortes em circunstâncias estranhas, que vão de supostas quedas de janelas ou de escadas, suicídios suspeitos e misteriosos envenenamentos só não causa espanto na imprensa russa que, por razões óbvias, não se aprofunda nesses casos e se limita às versões oficiais.
Além das mais de 10 mortes registradas apenas neste ano, o número de casos de ataques a inimigos do regime – ou até de supostos inimigos – sobe a dezenas, se recuarmos alguns anos.
Roteiristas de Hollywood devem estar acompanhando atentamente tudo isso e não será surpresa se, em breve, alguns desses casos começarem a aparecer nas telas. São histórias tão mirabolantes que vão exigir pouco esforço dos ficcionistas, seja no cinema ou na literatura.
O caso mais recente foi anunciado neste final de semana: Vladimir Nesterov, um dos principais cérebros do programa espacial da Rússia. Acusado de desvios de verbas no valor equivalente a mais de 60 milhões de dólares, ele foi encontrado morto em sua residência. A causa da morte não foi revelada.
Outros casos recentes
O general Alexei Maslov, ex-comandante das forças terrestres da Rússia e que também representou o país como embaixador junto à OTAN, a aliança militar do Ocidente, apareceu morto “após uma queda”.
A morte de Maslov se seguiu a de outro militar, também ocorrida em circunstâncias estranhas: o general Alexander Buzakov, de 65 anos, diretor do estaleiro de São Petersburgo, encarregado da construção de novos submarinos, morreu “de forma repentina”, segundo a imprensa oficial russa.
Pavel Antov, magnata do setor de carnes industrializadas. “Caiu” do alto de um hotel na Índia, onde passava férias com amigos.
Os corpos de dois diretores da gigante do setor de gás, Leonid Shulman e Alexander Tyulakov, foram encontrados no início deste ano, ao lado de notas de “suicídio”.
Em seguida, no espaço de um mês, três executivos, Vasily Melnikov, Vladislav Avayev e Sergey Protosenya, também foram encontrados em situações descritas como suicídio, mas com indícios de assassinato.
Em Maio, a polícia russa encontrou o corpo do proprietário de um resort de luxo em Sochi, Andrei Krukovsky. Ele teria caído do alto de um rochedo.
Para Aleksandr Subbotin, executivo da indústria de gás, a morte chegou por um suposto envenenamento.
Em Julho, o corpo de Yuri Voronov, executivo da área de energia, foi encontrado boiando na piscina de sua mansão, em São Petersburgo. Ele tinha um ferimento de bala na cabeça.
Em Agosto, Dan Rappaport, critico de Putin, nascido na Letônia, aparentemente caiu da janela de seu apartamento em Washington, a pouco mais de um quilômetro da Casa Branca.
Poucos dias depois, Ravil Maganov, diretor de uma empresa de petróleo, morreu ao cair do sexto andar de um hospital, em Moscou, onde havia sido internado para tratar de “uma severa doença”.
Para Grigory Kochenov, diretor de uma companhia de tecnologia, o salto para a morte foi da varanda de um apartamento.
Já um magnata do setor imobiliário, Dmitri Zelenov, despencou do alto da escada de um hotel, em Antibes, na Riviera Francesa, depois de um jantar com amigos. Estranho o fato de não usar o elevador…
Em Setembro, Pavel Pchelnikov, de 52 anos, foi encontrado morto na varanda de seu apartamento, em Moscou. Pchelnikov, era diretor da empresa de ferrovias da Rússia. Versão oficial de Moscou: ele se matou com um tiro.
Ivan Pechorin, alto executivo da Corporação de Desenvolvimento do Extremo Leste e do Ártico, morreu ao “cair de seu iate de luxo”, perto de Vladivostok.
Anatoly Geraschenko, presidente do Instituto de Aviação de Moscou, morreu “ao cair do alto de uma escada”, segundo um comunicado distribuído pelo instituto que ele dirigia.
Vladislav Avayev, de 51 anos, ex-vice-presidente do Banco Gazprom e ex-alto funcionário do Kremlin, foi encontrado morto em seu apartamento, em Moscou.
Envenenamento com um guarda-chuva
De todos os casos de mortes misteriosas, o que mais parece ter saído de um thriller de ficção de espionagem é a morte de um dissidente búlgaro, ocorrida na Inglaterra.. Perseguido pela polícia secreta búlgara, Giorgi Markov se refugiou em Londres, em 1978. Em Setembro daquele ano, Markov caminhava pela ponte Waterloo, quando sofreu uma forte dor na perna. Agentes búlgaros, com apoio da da antiga KGB soviética, o espetaram com um guarda-chuva. Levado para um hospital, os médicos encontraram uma minúscula cápsula no local do ferimento. Mas era tarde demais. O veneno já havia penetrado em sua corrente sanguínea e Markov não sobreviveu.