GUERRA

Efeito Putin: está faltando homem em Moscou!

Milhares de reservistas e outros mais jovens fugiram para escapar da convocação militar e a ausência masculina é perceptível

Por: Marcelo Bonfá
Da redação | 4 de novembro de 2022 - 21:56

The New York Times

MOSCOU – As tardes de sexta-feira na barbearia Chop-Chop, no centro de Moscou, costumavam ser movimentadas, mas agora só uma das quatro cadeiras estava ocupada. “Normalmente, a esta hora estaríamos lotados, mas metade dos clientes sumiu”, disse o gerente Olya.

O fato é que muitos fregueses – e metade dos barbeiros também – saíram da Rússia para evitar o recrutamento militar ordenado por  Vladimir Putin, cuja intenção era acrescentar 300 mil soldados às forças que lutam na Ucrânia.

Para onde foram os homens de Moscou?

Mural de propaganda promovendo os militares em Moscou (Foto: Nanna Heitmann/The New York Times)

Os que ficaram não estão circulando nas ruas por medo de receberem a notificação de convocação. “Eu estava vindo para o trabalho e vi as autoridades nas quatro saídas da estação do metrô, examinando os documentos do pessoal. Meu namorado é barbeiro aqui, mas também teve de fugir. A separação está sendo bem complicada, e a cada dia fica pior. É difícil saber o que fazer porque planejávamos tudo juntos, como casal”, contou ela pedindo, como as outras mulheres que a jornalista Valerie Hopkins entrevistou, que seu sobrenome não fosse revelado, por medo de retaliação.

Olya não é o único. Embora ainda haja um número razoável de homens na metrópole de 12 milhões de habitantes, sua presença se vê consideravelmente reduzida – em restaurantes, na comunidade hipster ( jovens alternativos que gostam de tecnologia e usam roupas diferenciadas e longas barbas), em reuniões sociais como jantares e festas, mas principalmente entre os intelectuais, que normalmente contam com renda maior e passaporte para viajar ao exterior.

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Recruta russo abraça sua parceira ao se despedir dela em um escritório de recrutamento (Foto: Nanna Heitmann/The New York Times)

Alguns, horrorizados com a invasão da Ucrânia, deixaram o país logo no início do conflito; outros, opositores do Kremlin em geral, fugiram por temer a prisão ou a opressão.  A maioria dos homens que saiu de circulação nas últimas semanas quer evitar ser intimada para guerra ou teme que a Rússia feche as fronteiras se o presidente declarar lei marcial.

Não se sabe exatamente quantos saíram desde que Putin anunciou o que chamou de “mobilização parcial”, apenas que os números foram consideráveis. Em 14 de outubro, o presidente anunciou que pelo menos 220 mil tinham sido convocados e disse que não precisa mais chamar os reservistas.

200 mil, só no Cazaquistão

Segundo as autoridades do vizinho Cazaquistão, no mínimo 200 mil cruzaram a fronteira, já que não precisam de passaporte para entrar. Outros fugiram para a Geórgia, Armênia, Azerbaijão, Israel, Argentina e a Europa Ocidental.

“A impressão que dá é que viramos um país basicamente feminino. Outro dia liguei para uns amigos porque precisava de ajuda com alguns móveis, e percebi que quase todos tinham ido embora”, contou Stanislava, fotógrafa de 33 anos, em uma festa de aniversário na qual praticamente só havia mulheres.

Esposas se reúnem, para não se sentirem sozinhas

Muitas mulheres casadas permaneceram em Moscou depois da partida dos maridos, movimento que começou assim que vieram os avisos de convocação ou antes mesmo que eles chegassem. “Eu e minhas amigas nos reunimos para beber vinho, conversar e dar apoio umas às outras, para sentirmos que não estamos sozinhas”, comentou Liza, de 43 anos, cujo marido, advogado de uma grande multinacional, recebeu a notificação vários dias antes do anúncio da mobilização.

Em seguida, ele pediu demissão e fugiu para um país da Europa Ocidental. Ela ficou porque a filha do casal está na escola e seus avós estão todos vivos. Aquelas que veem o marido partir para a guerra também sofrem com a solidão, agravada pelo medo de que o cônjuge não volte vivo.

Strip-tease, sem publico

De acordo com a imprensa local, o movimento em uma das maiores boates de strip-tease da cidade caiu 60%, e há menos seguranças disponíveis, porque foram convocados ou fugiram. Ao mesmo tempo, o volume de downloads de aplicativos de relacionamento aumentou significativamente nos países para os quais os russos fugiram.

Na Armênia, o número de inscrições no Mamba aumentou 135%, como informou um representante da empresa à “RBK”, publicação russa de notícias do setor financeiro; na Geórgia e na Turquia, o número de novos downloads já tinha batido os 110%, e, no Cazaquistão, ultrapassou 32%.

“Todos os caras razoavelmente interessantes foram embora. A oferta do mercado caiu pela metade”, constatou Tatiana, de 36 anos, que trabalha com vendas no setor de tecnologia, enquanto acompanhava o jogo de bilhar com as amigas em um clube exclusivo da badalada Stoleshnikov Lane.

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