Dezenove países da União Europeia já confiscaram bens da Máfia siciliana; da N'Dranghetta, da Calábria; ou da Camorra, de Nápoles.
Em Paris, um apartamento tomado de um operador de jogos clandestinos agora é utilizado para abrigar vítimas de tráfico humano. Em Alicante, na Espanha, uma vila confiscada de um traficante de drogas agora se transformou num centro para tratamento de dependentes químicos. Em Rotterdam, na Holanda, um barco que era utilizado para transportar drogas agora abriga uma escola náutica. Espalhados por diversos países europeus, restaurantes italianos evitam comprar produtos de empresas controladas pela Máfia.
Dezenove países da União Europeia já confiscaram bens da Máfia siciliana; da N’Dranghetta, da Calábria; ou da Camorra, de Nápoles. Até agora, 991 empreendimentos com finalidade social estão espalhados pelo continente, utilizando antigas propriedades controladas pela Máfia.
A La Poesia, uma trattoria italiana em Paris, serve o melhor vinho tinto siciliano e pratos deliciosos regados com azeite de oliva da Puglia e clássicos como macarrão All’Amatriciana servidos em cerâmicas feitas na Costa Amalfitana. Todos os produtos têm origem em propriedades agrícolas confiscadas.
O fornecedor dos produtos do La Poesia é a organização Libera Terra, que administra dezenas de propriedades e bens confiscados pela justiça italiana e que geram empregos e bons resultados sociais.
Permissão para confisco de bens
Essa é uma tendência na União Europeia. A maioria dos países do bloco já dispõe de políticas que permitem o confisco de bens do crime organizado, como propriedades rurais, imóveis urbanos, móveis, carros, para fins sociais.
“Os governos estavam focados na venda de bens confiscados”, explica Tatiana Giannone, especialista em bens confiscados da Libera Terra. “Mas cada vez mais há um movimento para reutilizar terras e propriedades e colocá-las em uso para o bem público. A Itália foi realmente a pioneira nisso”, afirma.
Somente na Itália, de acordo com a Libera, mais de 19 mil propriedades foram confiscadas de grupos como a máfia siciliana, a ‘NDrangheta calabresa e a Camorra napolitana, e existem quase 1.000 organizações sem fins lucrativos executando projetos de reutilização social em todo o país.
Bens a serviço da sociedade
Em Castel Volturno, perto de Nápoles, uma cooperativa fabrica mussarela em uma propriedade rural que antes pertencia ao crime organizado. Em Gênova, uma organização administra uma oficina de bicicletas e, em Roma, há uma casa de shows de jazz, entre muitos outros exemplos de utilização de bens confiscados pela justiça.
Os defensores da medida alegam que a reutilização social de bens confiscados não apenas faz uso de terras que, de outra forma, não seriam utilizadas, mas também envolve efetivamente as comunidades locais contra o crime organizado, tornando os esforços antimáfia mais resilientes a longo prazo. Na Romênia, quatro propriedades fornecem abrigo temporário para pessoas em situação de vulnerabilidade.
“A reutilização social coloca os cidadãos no centro da luta contra a criminalidade”, afirma Fabrice Rizzoli, presidente da Crim’HALT, uma organização sem fins lucrativos antimáfia francesa. “Antes só o Estado tinha o direito. Mas isso muda nossa mentalidade. Cabe a nós, cidadãos”, explica Rizzoli.