ECONOMIA

Milhares de empregos disponíveis na França, mas empresas não conseguem contratar

País tem pelo menos 400 mil vagas não preenchidas, a maior parte em restaurantes e hotelaria

Da redação | 13 de janeiro de 2023 - 12:07

 

The New York Times 

“Fechado até segundo aviso por causa da falta de pessoal”. Uma placa com essa frase está colada na porta do Red Rhino, restaurante com um cardápio variado de carnes, situado no centro de Paris. Esse não é o único. Milhares de outros estabelecimentos espalhados por toda a França reduziram suas atividades ou até fecharam as portas por falta de pessoal.

A segunda maior economia da Europa – depois da Alemanha – a França tem 400 mil vagas disponíveis nos setores de turismo, especialmente hotelaria e restaurantes, além da construção, transporte, enfermagem e agricultura.

Exemplos não faltam. O serviço de ônibus e trem foi cortado na cidade turística de Lyon, por conta da escassez de motoristas. No Vale do Loire, muitos vegetais não foram colhidos no verão, já que milhares de empregos da colheita não foram preenchidos.

Nos mais diversos setores de atividade, os empregadores continuam desesperados para contratar. Milhares não conseguem operar em sua capacidade máxima, por falta de mão de obra.

O governo do presidente Emmanuel Macron está propondo a legalização rápida de migrantes que estão ilegalmente no país e que queiram trabalhar em setores que enfrentam escassez de pessoal.

Como medida adicional, o governo está tentando restringir os benefícios do generoso sistema de desemprego da França, com seus longos períodos de ajuda de custo, em uma tentativa de fazer com que os desempregados voltem mais depressa à força de trabalho. Isso se explica porque, em certas atividades, as pessoas preferem viver do seguro desemprego do que enfrentar jornadas longas, com salários baixos. Mas os sindicatos são contra e argumentam que reduzir o benefício do desemprego pode levar muitas pessoas à pobreza.

Por sua vez, políticos à esquerda e à direita combatem a ideia de Macron de legalizar mais imigrantes para preencher as vagas existentes, alegando que a prioridade deve ser dada aos trabalhadores franceses. O problema é que muitos deles não se interessam pelas vagas existentes.

“Nossa sociedade depois da pandemia tem uma perspectiva diferente. As pessoas estão dizendo: não quero me sacrificar pelo trabalho”, apontou Thierry Marx, chef francês com estrela do “Guia Michelin” e presidente da Umih, a influente associação comercial de restaurantes e hotéis da França.

No setor hoteleiro e de restaurantes, o problema é urgente, uma vez que o turismo voltou a crescer na Europa depois da pandemia.

No Hôtel des Grands Boulevards, no bairro de Sentier, em Paris, o saguão estava cheio em um dia recente. Mas Olivier Bon, cofundador do Experimental Group, dono do hotel e de vários outros na Europa, afirmou que tem sido dificílimo contratar pessoal, especialmente em empregos de cozinha ou na função de garçom, que exigem longas horas de trabalho e salário limitado: “Muitos trabalhadores desapareceram – é uma luta para achá-los”, lamenta-se Bon. O restaurante agora interrompe o serviço às 22h45 para melhorar o horário dos trabalhadores e tentar atrair alguns.

França

O setor de turismo na França é um dos mais afetados pela falta de mão de obra. (Fotos: Pexels)

Os sindicatos ressaltam que a questão não é a escassez de trabalhadores, mas os baixos salários. Se as empresas os melhorassem, argumentam os sindicatos, encontrariam funcionários, afirma Denis Gravouil, funcionário do sindicato CGT, a segunda maior organização trabalhista da França.

Segundo os empregadores, a situação é mais complicada. Na França, por exemplo, onde o desemprego está perto de uma baixa em uma década de 7,1 por cento, os impostos sobre a folha de pagamento estão entre os mais altos da Europa, o que, de acordo com as empresas, dificulta a contratação. Os programas de reciclagem ajudaram muita gente a fazer a transição para novos trabalhos em tecnologia ou manufatura, mas tiveram menos sucesso em atrair pessoal para trabalhar como motorista de ônibus ou caminhão ou auxiliar de atendimento domiciliar, áreas em que a escassez é abundante.

E, com o desemprego na zona do euro perto de uma baixa recorde, alguns economistas apontam que é improvável que a escassez de mão de obra desapareça, apesar da recessão que é esperada. “Países e setores com um mercado de trabalho particularmente afetado podem permanecer com poucas opções”, observou Bert Colijn, economista sênior da zona do euro do ING Bank.

A França está apostando que a mão de obra imigrante pode ajudar a preencher vagas. Um projeto de lei que o Parlamento deve aprovar este ano criaria uma autorização de residência renovável de um ano para imigrantes com as “habilidades em demanda” e que estão no país ilegalmente, fazendo com que possam solicitar status legal de maneira rápida sem passar por empregadores. Para os requerentes de asilo, o projeto de lei também eliminaria a proibição de emprego durante seus primeiros seis meses no país.

O mesmo problema nos países vizinhos

A França não está sozinha: a Alemanha está se preparando para mudar sua política de migração a fim de atrair pessoas para empregos médicos, tecnológicos e de baixa qualificação, como o trabalho em cozinha. Os Países Baixos anunciaram planos semelhantes para atrair mais imigrantes qualificados para esse tipo de função.

No caso da França, Macron está tendo de se equilibrar em uma linha tênue: o projeto de lei também aceleraria a expulsão de alguns imigrantes que estão ilegalmente no país, sobretudo aqueles condenados por algum crime. “Trata-se de integrar melhor e expulsar melhor. Queremos as pessoas que trabalham, não as que roubam”, afirmou o ministro do Interior de Macron, Gérald Darmanin, a uma rádio francesa.

Essa conversa inflama Marx, que é filho de imigrantes poloneses e agora lidera um império gastronômico na França, tendo trabalhado duro para atingir o estrelato de chef. “Assim que mencionamos a palavra ‘imigração’, ela se torna uma ferramenta política, o que é perigoso. Um gerente de negócios não quer saber se a pessoa é imigrante ou não: ele procura uma solução para a empresa”. “Ser imigrante não significa ser delinquente. Sejamos honestos. Se fôssemos tirar os imigrantes do trabalho que fazem durante apenas três dias, o país chegaria a um impasse. Mas ninguém vai se atrever a dizer isso. Eles dizem: não, não é verdade, os franceses precisam desses empregos.”

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