Estudo indica benefícios do contato com a terra e baixa resistência de quem fica em casa
Ao contrário do que muitos pais pensam, se sujar com areia e lama pode ser fundamental para a saúde das crianças. Pesquisadores têm questionado os impactos da higiene excessiva da vida urbana, que as pessoas, principalmente as crianças, se expõem. O contato com seres microscópicos, mas que não causam infecções, é considerado essencial para criar anticorpos e reduzir doenças como asma e alergias alimentares.
De acordo com o professor de fisiologia integrativa e diretor do laboratório de neuroendocrinologia comportamental da Universidade do Colorado, Christopher Lowry, o contato com estes organismos inofensivos treina o sistema imunológico para moderar sua atividade, em vez de reagir exageradamente a qualquer invasor em potencial.
Um estudo da Universidade de Zurique mostrou que o ambiente onde as crianças são criadas tem um impacto direto no surgimento de alguns tipos de doenças. Segundo a pesquisa, as pessoas que crescem em fazendas geralmente são menos propensas a desenvolver asma, alergias ou distúrbios autoimunes como a doença de Crohn.
Quando crianças, estas pessoas tiveram maior exposição a uma gama mais diversificada de organismos que fortaleceram seus sistemas imunológicos.
A pesquisadora da Universidade de Parma, na Itália, Michele Antonelli, se dedicou a estudar as maneiras pelas quais as terapias com lama podem influenciar a saúde. Um de seus estudos mostrou que a lama pode ser usada para tratamento de doenças crônicas, como artrite, psoríase e dermatite atópica.
A dermatite, por exemplo, é causada por uma diminuição natural de microrganismos encontrados na pele. “Esses microorganismos podem desempenhar um papel importante em muitas das principais doenças crônicas”, evidencia.
A infância em ambientes rurais também tende a gerar uma forma mais saudável do corpo para lidar com o estresse. Quando o indivíduo se encontra em uma situação em que se sente ameaçado ou vulnerável o sistema imunológico aumenta a inflamação corporal.
As pessoas que cresceram nas áreas rurais em casos como este apresentam moléculas inflamatórias como a interleucina 6, em comparação com aqueles que cresceram nas cidades. Este resultado permaneceu mesmo nos casos em que os cientistas controlaram outros fatores, como a situação socioeconômica dos pesquisados.
A presença em menor quantidade dessas moléculas traz consequências para a saúde a longo prazo, como menores possibilidades de doenças crônicas causadas por inflamação. Além de terem mais riscos de desenvolverem depressão. “As pessoas que cresceram nas cidades são uma espécie de ‘bombas-relógio ambulantes’, em termos de inflamação”, afirma o pesquisador, Christopher Lowry.
Devido aos atuais benefícios do contato direto com a natureza apresentados pelas pesquisas, algumas iniciativas de estreitar estes laços começaram a surgir. Em creches e escolas do mundo todo, aulas de casinhas de barro foram implementadas no currículo escolar, estimulando atividades ao ar livre, além do contato com a terra, areia, barro.
A fundadora do Zeroseiplanet, Marilisa Modena, um centro italiano de pesquisa e treinamento focado nos benefícios de brincar ao ar livre, defende que apesar das iniciativas terem começado no norte da Europa, novos projetos e instalações tem começado em muitos outros países. “Estamos procurando maneiras de reintroduzir essas atividades que, até cerca de 50 anos atrás, eram experiências comuns para as crianças.”
A Finlândia por exemplo, implementou um projeto ambicioso de substituir o asfalto e o cascalho de pátios de algumas escolas por solo “transplantado” e vegetação retirada de um solo de floresta boreal. Além disso, os alunos receberam caixas de plantio para jardinagem.
Após apenas um mês, as crianças mostraram sinais de maior diversidade microbiana na pele e no intestino, além de uma melhora na função imunológica. Pesquisadores também analisaram que a proporção de moléculas anti-inflamatórias no plasma sanguíneo dos pequenos também aumentou, o que confirma uma melhoria no sistema imunológico.
Para além dos benefícios causados na saúde física e mental, o contato com a natureza e brincadeiras ao ar livre também geram maior facilidade de aprendizagem.
O neuropsiquiatra infantil e professor da Universidade de Palermo, na Itália, Francesco Vitrano, defende, após anos de estudo, que o ato de moldar e amassar materiais como lama ou areia pode ajudar as crianças a desenvolver a maneira como seus sentidos e movimentos interagem, conhecido como desenvolvimento sensório-motor.
Um estudo de 2009, de pesquisadores da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, mostrou que os benefícios de andar no parque, por exemplo, são ainda mais evidentes em crianças com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Apenas 20 minutos de caminhada em um parque, em comparação com um passeio de mesmo tempo em uma área urbana, melhoravam a concentração das crianças.