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Instabilidade econômica e reflexão sobre a vida: planos de maternidade congelados (Foto: FreePik)

Maternidade na geladeira: pandemia leva mulheres a reprogramar gravidez

O congelamento de óvulos cresceu durante os mais de dois anos de Covid-19, principalmente para mulheres maduras de classe média

Por: Júlia Castello
Da redação | 29 de setembro de 2022 - 12:43
Instabilidade econômica e reflexão sobre a vida: planos de maternidade congelados (Foto: FreePik)

Pesquisas recentes demonstram que o período de isolamento provocado pela pandemia da Covid-19 proporcionou o aumento na procura pelo congelamento de óvulos, de mulheres que decidiram adiar a maternidade. Só nos Estados Unidos, o interesse pelo procedimento aumentou 39% em relação aos níveis pré-pandêmicos. No Reino Unido, as consultas aumentaram em até 50% no verão de 2020, em comparação com o ano anterior.

O procedimento consiste em estimular a liberação de óvulos por meio de hormônios, para que sejam retirados e assim mantidos em local adequado para sua conservação. Posteriormente, a mulher tem a escolha de descongelar os óvulos e utilizá-los em um tratamento de fertilidade.

Nos últimos anos, a preservação de óvulos transformou-se numa opção de programação da maternidade para a mulher, além de procedimento médico para a fertilização artificial, já que as mulheres, independentemente de sua condição, podem optar pelo congelamento para ter filhos no futuro. O procedimento, desenvolvido na década de 1980, surgiu originalmente para ajudar mulheres com condições médicas graves que não conseguiam engravidar de forma natural.
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Esse interesse no congelamento de óvulos ocorre já em meio a uma tendência à maternidade em idade mais avançada e à gravidez tecnologicamente auxiliada. No Reino Unido, a idade média para se tornar mãe cresceu pela primeira vez desde a década de 1970 e está agora em um pico recorde de 30,7 anos.

Cresce maternidade após os 40

Já nos Estados, o número de mulheres que dão à luz com mais de 40 anos é o maior de todos os tempos. No Brasil a situação não é diferente. Um levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que entre 2009 e 2019, houve um crescimento de 63,6% entre o número de mães na faixa etária de 35 a 39 anos e 57% entre 40 e 44 anos. Os partos entre jovens até 19 anos, por outro lado, caíram 23% e 8,4% nas mulheres entre 20 e 29 anos.

Aumento de 57% de gravidezes entre mulheres de 40 a 44 anos no Brasil. (Foto: Pexels)

Entretanto, mesmo com esta tendência de busca pela maternidade mais tardia, os pesquisadores tentam desvendar os motivos pela subida relevante da demanda por estes procedimentos durante a pandemia.

A psiquiatra e diretora médica da LifeStance Health, Anisha Patel-Dunn, afirmou em entrevista para a BBC News que a pandemia foi um momento de reflexão, quando muitas pessoas reconsideraram suas escolhas de vida.

Reflexão sobre prioridades na vida

“A pandemia gerou uma crise existencial a muitas pessoas, que passaram a considerar mais seriamente, por exemplo, se a prioridade é desenvolver carreira profissional, reconsiderar o parceiro romântico… toda essa introspecção que estamos vendo pode resultar em pessoas que não se sentem prontas para ter filhos agora”.

Dados de um estudo do Pew Research Center de abril de 2022 mostraram ainda outro motivo pelo aumento da busca de congelamento de óvulos: a dificuldade de encontrar um parceiro ou parceira durante o período de isolamento social. De acordo com a pesquisa, três quartos dos casais de namorados dos Estados Unidos relataram que encontrar alguém era mais difícil do que nunca na era da pandemia.

Desafios e expectativas

Uma pesquisa de 2021 mostrou que as mulheres que se submetem ao congelamento eletivo de óvulos geralmente são solteiras, entre 36 e 40 anos, com ensino superior e emprego, o que evidencia a boa condição financeira das mulheres que realizam o procedimento.

Porcentagem de óvulos que fertilizam por idade da mulher (Foto: FertilityIQ)

Os altos custos para o congelamento de óvulos é, normalmente, motivo de crítica de movimentos da sociedade e especialistas, já que o congelamento de óvulos não é acessível para todas as mulheres. Só nos Estados Unidos, o processo custa em média 8.520 dólares a 9.740 dólares, o que equivale a mais de 45 mil reais.

Outra questão a ser levada em consideração, em meio à tendência, são as reais chances de uma gravidez bem-sucedida usando óvulos congelados. Especialistas têm demonstrado preocupação com a expectativa que muitas mulheres têm de que a preservação dos óvulos é procedimento a provas de falhas, o que não é verdade.

No Reino Unido, por exemplo, pesquisas baseadas em dados de 2016 fornecidos pelo órgão do governo britânico “The Human Fertilization and Embryology Authority” divulgaram que apenas 15% dos óvulos congelados no passado são de fato fertilizados com sucesso. E apenas 13% resultaram em gravidez. Isto representa um total de 22 gestações para 1.204 óvulos descongelados.

A idade em que as mulheres congelam seus óvulos tem relação direta com o sucesso na fertilização: mulheres com menos de 35 anos têm 18% de chance de ter um bebê quando cinco óvulos são congelados, mas isso cai para 7% se a mulher tiver mais de 35 anos na época de congelamento.

Instabilidade econômica e reflexão sobre a vida: planos de maternidade congelados (Foto: FreePik)

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