CEO da emissora saiu em defesa do programa, mas jornalistas e políticos fizeram inúmeras acusações
A entrevista do programa Town Hall, da CNN, com o ex-presidente Donald Trump resultou numa polêmica nacional, nos Estados Unidos, e numa tempestade de críticas contra a emissora e contra a jornalista Kaitlan Collins. A emissora foi atacada por todos os lados e se transformou no assunto mais comentado nas redes sociais, no país.
A deputada Alexandria Ocasio-Cortez, do Partido Democrata, de Nova York, disse no Twitter que a CNN deveria ter “vergonha de si mesma”. “Eles perderam o controle total desse programa e foram novamente manipulados para espalhar desinformação eleitoral, a defesa de 6 de janeiro (a invasão do Capitólio) e o ataque público a uma vítima de abuso sexual (ela se referia à escritora e jornalista Jean Carroll). O público estava torcendo por ele e rindo da apresentadora”, disse ela.
O repórter de mídia da própria CNN, Oliver Darcy, escreveu: “É difícil entender como pode interessar ao país o espetáculo de mentiras transmitido nesta entrevista”.
Depois de afirmar que os assessores de Trump estavam satisfeitos com o resultado, Darcy elogiou o trabalho da apresentadora Kaitlan Collins, mas ressaltou que ela assumiu uma “tarefa impossível e foi colocada numa posição desconfortável”, uma vez que a audiência era favorável a Trump, em sua maioria, e o aplaudia com frequência, enquanto ria dos comentários da jornalista.
Em nota oficial, a CNN defendeu o trabalho da apresentadora: “Esta noite, Kaitlan Collins deu um exemplo do que significa o trabalho de uma jornalista de categoria internacional. Ela fez perguntas duras e justas sobre questões reveladoras. E respondeu no ato com fatos, de forma a esclarecer os eleitores quanto às posições do presidente Trump, que deve ser o candidato republicano nas eleições de 2024. Esse é o papel da CNN: ter as respostas e checar os fatos”.
O apresentador da MSNBC, concorrente da CNN, Mehdi Hasan, também criticou a colega de profissão. “Pensei que a CNN com Trump seria ruim, mas é muito pior do que eu pensava”, tuitou Hasan. “A falta de acompanhamento. O público do lado dele. O deboche de uma vítima de abuso sexual.”
O editor-chefe do Daily Beast em Washington, Matt Fuller, chamou o caso de “desastre irresponsável do jornalismo”. A jornalista, vencedora do prêmio Pulitzer, Nikole Hannah-Jones, disse que a CNN estava “massivamente mal preparada para isso.”
Por outro lado, o CEO do canal americano, Chris Licht, passou o dia todo defendendo a CNN de críticos – incluindo grande parte de sua própria equipe: “Há tanta coisa que aprendemos ontem à noite sobre como seria uma segunda presidência de Trump e tudo isso foi revelado de uma maneira que nenhuma organização de notícias fez literalmente em anos.”
Licht acrescentou que “embora todos nós possamos ter ficado desconfortáveis ouvindo as pessoas batendo palmas, essa também foi uma parte importante da história, porque as pessoas naquela audiência representam uma grande faixa da América.”
No telejornal que foi ao ar logo após a entrevista, o âncora da CNN, Jake Tapper, declarou: “Foi uma noite interessante. Mr. Trump contou sua primeira mentira segundos após o início do programa, com sua versão de que houve fraude nas eleições de 2020. E as falsidades se seguiram, de maneira rápida e furiosa”, acrescentou Tapper.
Como foi a entrevista
Trump foi questionado sob a derrota na eleição passada, o roubo de documentos oficiais da Casa Branca e dos processos judiciais que responde. No momento mais tenso da entrevista ele chamou a jornalista de “pessoa desagradável”.
O ex-presidente foi abordado por que levou documentos confidenciais ao deixar a Casa Branca. Ele disse: “tenho todo o direito sob a Lei de Registros Presidenciais.” Collins argumentou que a Lei de Registros Presidenciais não permite um ex-presidente leve documentos com eles, pois eles são propriedade do governo federal quando um presidente deixa o cargo. Desse assunto em diante a discussão ficou acalorada nos estúdios.
Depois de discutir sobre o manuseio de documentos confidenciais por outros presidentes, Collins perguntou a Trump por que ele esperou para devolver os documentos quando sabia que o governo federal os estava procurando e o intimou a devolvê-los.
Na sequência, irritado com a pergunta, atacou a jornalista: “É muito simples – você é uma pessoa desagradável, vou te dizer”, disse Trump. “Você não conhece o assunto. Você está tão errada”, continuou ele. Os dois se cortaram várias vezes ao longo do debate enquanto a tensão só aumentava.
Ao discutir os acontecimentos de 6 de janeiro, Trump falou sobre o vídeo que postou incentivando as pessoas no Capitólio a irem para casa. “Eu não tinha um roteiro”, disse Trump sobre o vídeo. “Não preciso de roteiros como uma certa pessoa”, disse ele, referindo-se a Biden. Trump também disse estar inclinado a perdoar “uma grande parte” dos manifestantes se for reeleito, mas não todos, dizendo que alguns “ficaram fora de controle”.
Collins abordou Trump com uma variedade de perguntas, incluindo várias sobre o veredicto de quarta-feira no caso envolvendo Jean Carroll. Ela vai receber 5 milhões de dólares em danos por difamação depois do júri federal de Manhattan concluir que Trump abusou dela sexualmente, em 1996. Ele reforçou a versão que não conhece Carroll – chegando ao ponto de xingar seus filhos. “Esta mulher, eu não a conheço. Nunca a conheci. Não tenho ideia de quem ela seja”, disse ele.