Estudos mostram que as baleias são parentes distantes de vacas, porcos e camelos, entre outros
Há cerca de 400 milhões de anos, um ancestral de todas as criaturas existentes hoje com pernas e braços saiu dos mares e caminhou pela terra. Cinquenta milhões de anos depois, um descendente daquele caminhante retornou para os oceanos. Ao longo de milhões de anos, aquela criatura foi evoluindo. Até se transformar nas baleias, golfinhos e botos que hoje circulam pelos oceanos.
Em apenas 10 milhões de anos – um piscar de olhos em termos de evolução animal e humana – uma enorme variedade de espécies passou por inúmeras transformações internas e externas. Descendentes do primeiro caminhante trocaram braços e pernas por nadadeiras e perderam os pelos. Entre seus parentes não muito distantes estão vários animais marinhos, entre os quais as focas.
E o mais surpreendente: dados genéticos confirmam que as baleias fazem parte da mesma cadeia evolucionária que deu origem às vacas, porcos e camelos, um ramo denominado Artiodactyla. Mas o formato do corpo foi apenas uma das mudanças que ocorreram entre as baleias. Para sobreviver na água, elas passaram por alterações no sangue, nos pulmões, pele e uma série de outras. Muitas dessas mudanças não aparecem nos fósseis. Só foram descobertas graças à genética. O acesso a uma grande variedade de genomas dos cetáceos permitiu aos cientistas identificarem as alterações moleculares que possibilitaram o retorno à vida nos mares.
Os primeiros cetáceos perderam muito mais do que as pernas quando retornaram à vida marinha. Cadeias inteiras de genes se tornaram inúteis e foram descartadas e substituídas por outras. Trata-se de uma questão de “use it or lose it” (use ou perca), resume o professor Michael Hiller, do Instituto Senckenberg de Pesquisas de Genoma, de Frankfurt, Alemanha, um dos maiores especialistas em evolução de cetáceos. Para resgatar o histórico dessa transição, Hiller e outros pesquisadores do instituto compararam os genomas de 4 cetáceos: baleias Minke, Cachalotes (Sperm Whale), Orcas e Golfinhos com aqueles de 55 mamíferos terrestres e aquáticos, incluindo morsas, focas e peixe-boi.
E descobriram que 85 genes se tornaram descartáveis quando os ancestrais dos cetáceos retornaram aos mares. As conclusões desse estudo foram publicadas pela revista Science Advances.
Entre outros dados, eles descobriram que os cetáceos perderam 4 genes relacionados com a produção de melatonina, o hormônio que regula o sono. Daí o fato de que os atuais cetáceos, quando dormem, desligam só uma parte do cérebro, deixando a outra em alerta. Fazem isso para que possam subir à superfície e respirar, quando necessário. “Se não é preciso regular o sono, então não é necessária a melatonina”, lembra Hiller.